Era tudo sempre igual.
“Faça isso! Faça aquilo”.
Limpe seu quarto. Coma legumes. Não brigue com sua irmã. Vá para escola. Como
mamãe podia ser tão chata?
Tá, ela não era sempre
chata. Fazia penteados lindos no meu cabelo, minhas amigas morriam de inveja.
Preparava sobremesas deliciosas nos finais de semana. Nunca deixava que eu me
sentisse feia, baixinha ou burra. Mas era tão difícil gostar dela quando me colocava
de castigo!
Minha irmã sempre se
pareceu com mamãe. Ela herdou o cabelo liso, os olhos azuis e a magreza linda
de morrer. Eu fui castigada com os cachos e os olhos escuros do meu pai. O que
mais chamava atenção nela era o sorriso, era tão lindo. Papai disse que depois
de vê-la sorrir sabia que a queria com ele para sempre.
Adorava espiar mamãe em
frente ao espelho penteando aquele cabelo longo. Ela parecia uma sereia. Foi em
uma dessas espiadas, que a vi tirar mechas grossas de seu cabelo presas na
escova. Coitada, imaginei que tinha sido doloroso, afinal as lágrimas logo
escorreram do rosto dela. Corri para abraça-la e dizer que não se preocupasse,
cabelo cresce todos os dias. Não o de mamãe, ele nunca voltou a crescer.
Papai me chamou para explicar
que mamãe estava doente, disse que não era grave, mas que precisava do nosso
apoio. Se não era grave, não entendo porque minha irmã chorou a noite toda
depois da conversa.
Em pouco tempo os cabelos
de mamãe se foram, mas ela ainda me parecia tão bonita. Já não cozinhava como
antes, mas fazia desenhos e pinturas lindas. Passava temporadas no hospital e
quando voltava arrumava meus cabelos. Eu ficava com medo dela ficar triste e
sempre me oferecia para cortar meus cachos e dar alguns a ela. Mamãe sempre sorria.
Na manhã de uma terça,
voltei da escola e não vi minha mãe no jardim. Fui ao quarto ver se estava
dormindo. Encontrei-a sentada na cama, terminando um bordado. Sentei-me ao seu
lado e ela sorriu. Ela me parecia tão cansada que me ofereci para contar uma
história e assim poderíamos dormir um pouco juntas.
Contei-lhe sobre uma
princesa de um reino muito antigo, que só existia no meu pensamento. Desafiada
a proteger o seu povo, a princesa deveria chegar de nuvem até o céu e pedir a
Deus, que cuidasse pessoalmente do reino em que ela vivia. Deus concordaria,
mas em troca ela teria que ficar no céu para sempre, guardando lá de cima as
pessoas que ela amava.
Mamãe deve ter gostado da
história. Naquele dia ela pegou a nuvem e se tornou a guardiã do nosso reino.
Até hoje papai, minha irmã e eu sabemos que estamos protegidos, e que alguém
cuida pessoalmente de cada um dos nossos dilemas.
3 comentários:
Nossa que lindo esse texto, me emocionei mesmo... lindo mesmo, parabéns.
:)
http://marinawho.blogspot.com.br/
Que lindo, foi você quem escreveu?
Nossa, eu adorei.
beijos
http://inexplicavelconsumismo.blogspot.com.br/
Obrigada pelos elogios gente.. o texto é meu sim..
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